Por: José Mendonça Monteiro
As deportações de imigrantes nos Estados Unidos atingiram, recentemente, o nível mais alto da última década. No ano fiscal de 2024, que se encerrou em 30 de setembro, o Serviço de Imigração e Controle de Alfândega (ICE) deportou 271.484 imigrantes para quase 200 países, superando os números de qualquer ano da administração anterior de Donald Trump.
A maioria dos deportados entrou ilegalmente no país através da fronteira sul, provenientes de diversas nações. Cerca de 33% possuíam antecedentes criminais ou acusações pendentes, incluindo violações de trânsito, delitos relacionados a drogas, infrações de imigração e agressões.
Estima-se que entre 11 e 15 milhões de imigrantes vivam nos Estados Unidos sem a documentação necessária. Muitos deles desempenham papéis cruciais em setores como agricultura, construção civil, restaurantes e hotéis. Especialistas alertam que deportações em massa podem ter impactos econômicos significativos, afetando o abastecimento de alimentos e elevando preços, além de exigir um esforço logístico e econômico substancial.
Medidas Implementadas Após a Posse
Logo após assumir o novo mandato, o presidente Trump assinou uma ordem executiva declarando emergência na fronteira sul com o México, autorizando o envio de tropas para auxiliar os agentes de fronteira. Além disso, o Congresso, com maioria republicana, aprovou a “Lei Laken Riley”, que permite a detenção e deportação de imigrantes indocumentados acusados de certos delitos, mesmo sem condenação formal. Essa legislação, nomeada em homenagem a uma estudante assassinada por um imigrante, reflete a postura rígida da administração em relação à imigração ilegal.
Soberania Nacional e Proteção Econômica
A soberania dos Estados Unidos confere ao país o direito de organizar sua sociedade e proteger sua economia. Comparações com a China são frequentes, especialmente considerando que ambos os países lideraram o crescimento econômico global por anos. Recentemente, a China ultrapassou os EUA em certos aspectos econômicos, fato atribuído por alguns à sua política de imigração mais restritiva. Defensores das políticas de Trump argumentam que um controle migratório mais rígido é essencial para proteger empregos e recursos para cidadãos americanos, mantendo a competitividade econômica.
Possíveis Violações de Direitos Humanos
As recentes operações de deportação levantam preocupações sobre possíveis violações de direitos e garantias fundamentais. Relatos indicam que, em Newark, Nova Jersey, residentes sem documentos e até cidadãos americanos foram detidos sem mandado. Tais ações podem infringir direitos processuais garantidos pela Constituição dos EUA, como o devido processo legal e a proteção contra buscas e apreensões injustificadas.
Desilusão dos Eleitores e a Importância do Voto Consciente
Muitos eleitores que apoiaram Trump na esperança de melhorias econômicas e sociais podem estar enfrentando resultados contrários às expectativas. As políticas de deportação em massa podem levar a divisões sociais, afetar comunidades inteiras e gerar instabilidade econômica, especialmente em setores que dependem da mão de obra imigrante. Isso destaca a importância de um voto consciente, onde os eleitores consideram as implicações abrangentes das políticas propostas pelos candidatos.
Pactos Políticos e a Busca pelo Interesse Nacional
Há especulações sobre um possível pacto entre partidos políticos nos EUA para eleger líderes com visões conservadoras, visando resgatar a sociedade e a economia americanas. Medidas como cortes de ajuda a outros países e a saída de organizações internacionais, como a OMS, refletem uma postura isolacionista. Embora tais ações possam ser vistas como uma tentativa de priorizar interesses nacionais, é crucial que partidos políticos trabalhem em prol do bem comum, equilibrando interesses nacionais com responsabilidades globais.
Possíveis Violações do Direito Internacional
As medidas de deportação em massa e o afastamento dos EUA de compromissos internacionais podem ser interpretados como violações do direito internacional. A Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados, por exemplo, estabelece obrigações para a proteção de indivíduos que buscam asilo. A deportação sumária de indivíduos sem a devida consideração de seus pedidos de asilo pode violar esses princípios.
O Sonho Americano e a Contribuição dos Imigrantes
O “Sonho Americano” sempre esteve intimamente ligado à ideia de que indivíduos, independentemente de sua origem, podem alcançar sucesso nos EUA através de trabalho árduo e determinação. Figuras proeminentes na sociedade americana, incluindo empresários, cientistas e líderes políticos, são descendentes de imigrantes ou imigrantes eles próprios. O próprio presidente Trump é neto de imigrantes alemães, o que ressalta a profunda influência dos imigrantes na formação e desenvolvimento dos Estados Unidos.
Recusa de Países em Receber Deportados e Sanções dos EUA
Alguns países têm resistido em aceitar cidadãos deportados dos EUA, levando a retaliações americanas. A Nigéria, por exemplo, retaliou medidas dos EUA contra seus cidadãos, impondo sanções próprias. O presidente do Brasil também criticou duramente as sanções impostas aos brasileiros. A legitimidade dessas sanções é debatida, especialmente quando consideradas à luz do direito internacional e das relações diplomáticas.
Ausência de Convites a Líderes Africanos
A ausência de convites do presidente Trump a líderes africanos tem sido interpretada por alguns como arrogância ou desprezo. No entanto, a administração alega que essa decisão se baseia em preocupações sobre a governança nesses países e o tratamento dispensado aos seus próprios cidadãos. Independentemente das motivações, essa postura pode afetar as relações diplomáticas e a cooperação entre os EUA e as nações africanas.
Desafios para a Segurança Publica Cabo-verdiana
A recente onda de deportações dos Estados Unidos levanta questões jurídicas e sociais de extrema relevância para Cabo Verde, especialmente considerando o histórico de deportações ocorrido no início de ano 2000, que resultou no aumento da criminalidade e no comprometimento da segurança pública. O Estado cabo-verdiano, à época, não implementou políticas eficazes para a reintegração desses indivíduos, permitindo que um novo modus operandi criminoso se enraizasse no país, cujos efeitos são sentidos até hoje. A questão central reside na capacidade do país em lidar com indivíduos que, muitas vezes, foram educados num país com duplo sistemas de ensino, (um que prepara uma classe restrita de cidadãos para conservar o país por meio de soft power e outro que prepara outra classe de cidadãos para conservar o país por meio de hard power), em que esses, coram preparados, num sistema que lhes educou para manter a economia do país através da luta armada, usando a violência como ferramenta de sobrevivência, sendo que nem mesmo os Estados Unidos, com seu aparato sofisticado de segurança e programas de ressocialização, conseguiram reabilitá-los. Assim, surge a dúvida: Cabo Verde, com recursos limitados e já enfrentando desafios estruturais na sua segurança pública, estaria hoje preparado para receber essa nova vaga de deportados? Se houver um plano bem estruturado, esses indivíduos poderiam ser incorporados ao mercado de trabalho e até contribuir para mitigar a falta de mão de obra qualificada que assola o país devido à crescente emigração de jovens para a Europa. No entanto, sem políticas eficazes de reinserção social e controle de segurança, há o risco iminente de um novo ciclo de instabilidade e criminalidade se intensificar, comprometendo ainda mais o tecido social e a ordem pública.
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