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Os ventos da nova história

Por: Germano Almeida

Mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa! Muito ao contrário do que esperava, afinal o último 13 de janeiro trouxe algumas novidades. Não estou a referir ao caso da  UCID que, desta vez, olimpicamente se escusou de falar da prisão do deputado Amadeu Oliveira. Eu ouvia o discurso do representante desse partido e de cada vez que ele fazia uma pausa ou hesitava, eu pensava, é agora, é agora que ele vai finalmente meter o Amadeu, ele não vai aguentar, está quase lá, está mesmo à beira do Amadeu… Porém, o  deputado José Luís resistiu estoicamente, pobre Amadeu, desta vez esquecido nesse 13 de janeiro!

Também não achei grande novidade o presidente da República ter acompanhado o lider parlamentar do MpD na louvação ao Dr. Carlos Veiga enquanto figura primordial do movimento que conduziu ao 13 de janeiro. Novo mesmo, talvez tenha sido a coloquial designação de “champion da liberdade e da democracia” por ele atribuida ao Carlos Veiga. Estou habituado a ouvir o treinador de futebol Jorge Jesus falar com grande entusiasmo da sua “champion”, mas no presidente da República e na solenidade daquela cerimónia no salão nobre da Assembleia Nacional, francamente estranhei e dei por mim sobressaltado. Mas deve ser isso, estou a ficar velho para os ventos da nova História.

Porém, verdadeiramente grande novidade da sessão de homenagem ao 13 de janeiro, foi ouvir o lider parlamentar do MpD, do alto da solenidade da tribuna da Assembleia Nacional, instar ou exigir ou exortar o PAIGC/CV a fazer um pedido de desculpas ao povo das ilhas pela imposição do regime de partido único em 1975.  

Temos que acreditar que ele não falava em nome próprio. Ali do alto da tribuna do Parlamento, ele representava e falava em nome do Movimento para a Democracia, cujos principais representantes, na época e alguns ainda hoje, foram todos, por longos ou por breves tempos, militantes assanhados do partido único e por conseguinte participantes ativos, ou pelo menos cúmplices, desses horrores que devem convidar a um público pedido de desculpas. Aceitemos, no entanto, que essa não poucas vezes aguerrida militância tenha sido um pormenor da própria ocasião. 

  O que já não será pormenor será essa insistência em pedido de desculpas pelo partido único. É que pedir desculpas pelo partido único, arrepender-se da instauração do partido único em Cabo Verde em 1975, é exatamente o mesmo que pedir desculpas pelo 5 de julho, é o mesmo que pedir desculpas pela indepêndencia.

Lembro-me de já termos passado por algo semelhante, creio que num dos governos do PAICV. De repente surge no Parlamento uma moção ou qualquer coisa do género, cuja função era pedir desculpas às pessoas prejudicadas pela independência nacional. Confesso não saber como a coisa terminou, tão abismado fiquei com o disparate político.

 É que ninguém pode acreditar que possa haver independência de um país, sem que concomitantemente haja alguma forma de violência. Sem irmos mais longe, a própria lei que instituiu a independência de Cabo Verde foi de uma extrema violência para os que não a queriam. Dizia essa lei algo parecido com: são portugueses, até ao dia anterior à independência de Cabo Verde! No dia seguinte já eram forçadamente cabo-verdianos. Foi uma forma de violência e certamente não das mais delicadas. Mas era necessária, para que hoje houvesse a independência nacional que brevemente se comemora.

Se aceitarmos que há um povo da independência e um povo da democracia, teremos que concluir que o povo da democracia não quer ou não quis a independência. Mas sem dúvida que isso seria forçado, sendo certo que nós outrs que estivemos com a “independência” e também com a “democracia”, não saberíamos em que lugar nos situarmos.

A independência é o momento fundante e único da República de Cabo Verde. Nenhuma outra data da nossa história poderá alguma vez comparar-se, sequer por aproximação, com o 5 de julhe de 1975.

“…nós, Povo das Ilhas, quebramosas cadeias da subjugação colonial e escolhemos livremente o nosso destino Africano. E a História reterá que filhos do nosso Povo glorioso de Cabo Verde, que se bateram com valentia na frente de luta armada na Guiné, estiveram prontos e decididos para o combate armado em Cabo Verde também, se tal viesse a revelar-se como a única via para a libertação das nossas queridas Ilhas.  POVO DE CABO VERDE,

Hoje,5 de julho de 1975, em teu nome, 

a Assembleia Nacional de Cabo Verde

Proclama Solenemente a República de Cabo Verde como Nação Independente e Soberana.”

 Deve-se pedir desculpas por isso? Nessa data, cerca de 80% dos eleitores cabo-verdianos votaram pela independência e no partido que a tinha conquistado. Em 1992 cerca de 80% dos eleitores cabo-verdianos votaram pela mudança política e no partido que a promovia. É a história e a sua dialética e por isso todos aqueles que participaram das conquistas nacionais de 1975 a 1990 deveriam sentir-se orgulhosos, dizer abertamente, eu participei dessa luta vitoriosa. Mas é um erro grave que ao longo das mudanças de partido no poder temos vindo a repetir, uma espécie de, com a água do banho também deitar fora o bébé.  

Mas este ano o 13 de janeiro foi verdadeiramente um dia de coisas estranhas, não tendo sido a menor das estranhesas ver a Câmara Municipal da Praia desrespeitar um feriado nacional e considerar o 13 de janeiro um normal dia de trabalho para os funcionários. O que se passa com o Cabo-verdiano?! Que tipo de água anda-se por aí a beber a ponto de uns andarem a ver “champions” e outros a desrespeitar um feriado nacional?! Sou eu mesmo que ando a ficar velho?   

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