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O Paradoxo do Crescimento Económico em Cabo Verde: Um Funil de Desigualdade

Por: António Medina

Nos últimos anos, Cabo Verde tem experimentado um crescimento económico notável, refletido em um aumento do Produto Interno Bruto (PIB). No entanto, esse crescimento traz à tona um paradoxo preocupante: enquanto as estatísticas económicas sobem, a realidade social de muitos cabo-verdianos permanece estagnada, ou até piora. O aumento da pobreza, o crescimento de assentamentos informais, a diminuição do poder de compra e a emigração em massa de jovens são evidências de um desenvolvimento que não é inclusivo.

A imagem do desenvolvimento em Cabo Verde pode ser comparada a um funil. Na parte superior, encontramos as ilhas periféricas, que, apesar de sua beleza natural e potencial turístico, enfrentam desafios significativos em termos de infraestrutura e oportunidades económicas. À medida que descemos pelo funil, vemos a cidade da Praia, onde o crescimento económico parece mais concentrado e visível. Contudo, essa concentração gera uma desigualdade que se intensifica em níveis alarmantes.

O aumento das casas de lata nas periferias da ilha de São Vicente é um reflexo direto da falta de políticas habitacionais adequadas. Muitas famílias, em busca de melhores condições de vida, são forçadas a habitar em áreas informais, onde a dignidade humana é constantemente comprometida. O que deveria ser um sinal de progresso torna-se, na realidade, um símbolo de exclusão.

Além disso, o poder de compra da população está em declínio. Com os preços de bens essenciais em alta e os salários estagnados, muitas famílias lutam para atender suas necessidades básicas. As constantes reivindicações das classes sociais, por melhores salários e condições de trabalho, são um grito por justiça social em um país que parece ter esquecido seus cidadãos mais vulneráveis.

A emigração de jovens em busca de oportunidades fora do país é outra consequência desse descompasso entre crescimento económico e desenvolvimento social. Cabo Verde, uma nação marcada pela diáspora, vê seus jovens abandonarem suas terras em busca de uma vida melhor, levando consigo o potencial e a esperança de um futuro mais próspero.

Este funil do desenvolvimento revela não apenas a concentração de recursos, mas também a necessidade urgente de uma abordagem mais equitativa. É evidente que o crescimento económico de Cabo Verde, por mais impressionante que seja em números, não se traduz em qualidade de vida para a maioria da população. O governo e as instituições devem, portanto, adotar políticas que promovam um crescimento inclusivo, garantindo que os benefícios do desenvolvimento económico cheguem a todas as ilhas e comunidades, especialmente aquelas mais periféricas e vulneráveis.

Investimentos em educação, saúde, infraestrutura e habitação são fundamentais para reverter a situação atual. A educação, por exemplo, deve ser uma prioridade, não apenas em termos de acesso, mas também em qualidade. É imprescindível que o sistema educacional capacite os jovens, preparando-os para o mercado de trabalho e reduzindo a emigração. Além disso, a formação profissional deve ser incentivada, com parcerias entre o governo e o setor privado, de modo a alinhar a formação às necessidades do mercado.

Na saúde, é crucial garantir que todos tenham acesso a serviços básicos de qualidade, independentemente de onde residam. As disparidades no acesso a cuidados de saúde podem ser fatais, e uma população saudável é vital para o desenvolvimento sustentável. O fortalecimento do sistema de saúde, com atenção especial às áreas mais desfavorecidas, contribuirá para uma sociedade mais produtiva e resiliente.

A infraestrutura, por sua vez, deve ser desenvolvida de forma a conectar as ilhas e facilitar o comércio, o turismo e o acesso a serviços essenciais. A falta de transporte adequado e de estradas de qualidade perpetua o isolamento das comunidades, limitando suas oportunidades de crescimento. Projetos de infraestrutura devem ser planejados com uma visão a longo prazo, priorizando a sustentabilidade e a preservação ambiental.

No que diz respeito à habitação, é urgente implementar políticas habitacionais que promovam a construção de moradias dignas e acessíveis. O aumento das habitações informais é um sinal de falhas nas políticas de urbanismo e habitação. O governo deve trabalhar em colaboração com organizações comunitárias e ONGs para desenvolver soluções habitacionais que atendam às necessidades da população.

Cabo Verde possui um potencial enorme, com recursos naturais e um povo resiliente e criativo. No entanto, é crucial que esse potencial seja canalizado de maneira a beneficiar todos os seus cidadãos, e não apenas uma elite privilegiada. O futuro do país depende da capacidade de transformar o crescimento económico em desenvolvimento social real, onde a dignidade, a inclusão e a equidade sejam prioridades.

26/10/2024

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