Por: João Serra*
Diferentes investigadores e economistas, mundialmente renomados, têm diferentes visões sobre a importância relativa das condições e fatores que tornam os países mais ricos ou mais pobres.
Dentre aqueles que discordam da tese de Landes, estão os reconhecidíssimos economistas Daron Acemoglu e James A. Robinson.
No seu livro “Porque Falham as Nações: As Origens do Poder, da Prosperidade e da Pobreza”, publicado em 2012, Acemoglu e Robinson mostram que são as instituições políticas e económicas que estão na base do êxito económico ou na sua falta.
Os fatores que esses autores mais discutem na obra são as chamadas “boas instituições”, que podem ser definidas como leis e práticas que motivam as pessoas a trabalhar duro, tornarem-se economicamente produtivas e, assim, enriquecerem a si mesmas e a seus países.
Os autores referem que “é o processo político que determina o tipo de instituições económicas existentes e são as instituições políticas que determinam como este processo funciona. (…).
É também necessário considerar, de uma forma mais abrangente, os fatores que determinam a distribuição do poder político na sociedade, em particular a capacidade dos diferentes grupos para prosseguirem os seus próprios objetivos ou impedirem outros de prosseguirem os deles. Como as instituições influenciam o comportamento e os incentivos na vida real, geram o êxito ou o fracasso das nações”.
Acemoglu e Robinson colocam, entre outras hipóteses (política, geográfica), a hipótese cultural como fator de desigualdade do mundo, mas não concordando com ela, ao contrário de Landes, mencionam, nomeadamente, que “a hipótese cultural, tal como a geográfica, tem uma origem ilustre, que remonta pelo menos ao grande sociólogo alemão Max Weber, que sustentava que a Reforma protestante e a ética protestante que estimulou, desempenharam um papel fundamental no que diz respeito a facilitar a ascensão da sociedade industrial atual na Europa Ocidental. (…).
Mas será que a hipótese cultural é útil para compreender a desigualdade do mundo? Sim e não. Sim, no sentido que as normas sociais, que estão ligadas à cultura, são importantes e podem ser difíceis de mudar. (…). Mas, não, na maioria dos casos, porque os aspetos da cultura geral realçados – a religião, a ética nacional, os valores africanos ou latinos – não são importantes para compreender como chegámos aqui, e, por que razão, persistem as desigualdades do mundo.
Outros aspetos, como o grau de confiança que as pessoas depositam nos outros e em que medida são capazes de cooperar, são importantes, mas são sobretudo uma consequência das instituições, não uma causa independente”.
Por isso, Acemoglu e Robinson defendem que embora possa haver diferenças no que respeita às práticas, aos valores, normas e costumes, elas não constituem as causas, antes as consequências das diversas vias de desenvolvimento económico e político, seguidas pelas diferentes nações.
Na sua obra, Acemoglu e Robinson mostram que o sucesso de um país surge quando as instituições são inclusivas e pluralistas. E as instituições são “boas” a ponto de criarem incentivos para quem investe no futuro, quando incluem a maioria da população na comunidade política e económica.
Na verdade, os investidores e inovadores têm de ter garantia da apropriação dos “frutos” do seu sucesso, já que a prosperidade moderna é gerada por investimento e inovação. E as condições mínimas para essa garantia são, nomeadamente: uma adequada constituição escrita, eleições democráticas, poder político centralizado e competente que acomode todos os interesses, direito à propriedade com tratamento igual de todos face à lei, respeito pelos contratos, facilidade para abrir uma empresa, mercados competitivos e liberdade para que os cidadãos se expressem e desempenhem as profissões pretendidas.
Dito nas palavras de Acemoglu e Robinson, “Instituições económicas inclusivas […] são aquelas que permitem e incentivam a participação da grande massa de pessoas em atividades económicas que fazem o melhor uso de seus talentos e habilidades e que permitem que os indivíduos façam as escolhas que desejam.”
Essas instituições económicas inclusivas, por sua vez, surgem de “instituições políticas que distribuem o poder amplamente na sociedade e o sujeitam a restrições […] Ao invés de serem investidas em um único indivíduo ou grupo restrito, o poder político [inclusivo] repousa em uma ampla coligação ou uma pluralidade de grupos.”
Dessa impressionante dicotomia, os autores tiram conclusões interessantes: enquanto regimes absolutistas, com instituições económicas extrativas, podem às vezes alcançar crescimento económico, esse crescimento é baseado na tecnologia existente, pelo que não é sustentável e está propenso a entrar em colapso. Isso porque as instituições inclusivas são necessárias para um crescimento contínuo baseado na mudança tecnológica.
Assim, pode-se ingenuamente esperar que líderes ditadores ou autoritários promovam o crescimento económico a longo prazo, uma vez que esse crescimento geraria mais riqueza para eles extraírem. Todavia, os seus esforços são distorcidos, por dois motivos.
Por um lado, porque o que é economicamente bom para os cidadãos individuais, pode ser mau para a elite política. E, por outro lado, porque o crescimento económico pode ser melhor promovido por instituições políticas que abalariam a hegemonia da elite.
Saliente-se que, segundo os autores, as instituições são extrativas quando são antidemocráticas e restringem os ganhos económicos a uma elite, distribuindo a riqueza “para cima”, tornando os pobres relativamente cada vez mais pobres.
Em suma, pode-se dizer que, na perspetiva de Acemoglu e Robinson, a prosperidade / desenvolvimento de uma nação depende da capacidade dos governantes tornarem as instituições inclusivas e pluralistas. Nestas instituições, todos devem ter as mesmas oportunidades, por forma a poderem libertar o seu potencial criativo e o do país, construindo uma economia com vantagens competitivas, criando mais riqueza para as empresas e os respetivos trabalhadores e para o Estado, e gerando um círculo virtuoso que permite o progresso e a partilha de bem-estar por todos.
Tal qual a tese de David S. Landes da predominância do substrato cultural na riqueza e pobreza das nações, também a tese de Acemoglu e Robinson com foco restrito nas instituições inclusivas, é criticada por os autores ignorarem ou descartarem outros fatores.
Pessoalmente, penso que as instituições inclusivas, embora não sejam o único determinante da prosperidade das nações, tal qual defendido pelos autores (os fatores são múltiplos e diversos), talvez sejam o fator decisivo, que explica grandemente as diferenças nacionais no que diz respeito à prosperidade.
O livro “Porque Falham as Nações” devia ser, assim, de leitura obrigatória para políticos e qualquer um preocupado com o desenvolvimento económico. As conclusões dos autores sobre o que pode e o que não pode ser feito hoje para melhorar as condições nos países pobres, são interessantes e deveriam estimular o debate no nosso país, onde as instituições inclusivas deixam ainda muito a desejar.
Praia, 11 de junho de 2023
*Doutor em Economia