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Sociedade

Novo ano judicial: Problemas financeiros e excesso de formalismo são factores limitativos da produtividade

No Ministério Público houve um aumento de produtividade que poderia ser bem maior, caso fosse colmatada a situação de “exiguidade” dos recursos humanos. O CSMP pede reforço de orçamento para propiciar aumento da produtividade. O Conselho Superior da Magistratura Judicial considera, por seu lado, que o excesso de formalismo atrapalha a resolução de litígios.

De acordo com o relatório anual sobre a situação da justiça, do CSMP, a produtividade aumentou em 15,8% comparativamente ao ano judicial de 2020/2021, a pendência nacional diminuiu em 5,8% e os valores de referência processual fixados foram ultrapassados, a nível nacional, em 59,2%.

Contudo, o número de magistrados e de oficiais de justiça “continua exíguo” para fazer face ao volume de processos pendentes e tramitados e para preencher os lugares de representação junto dos tribunais superiores e reforçar a representação junto dos tribunais de segunda instância.

O documento destaca ainda que a coadjuvação pela Polícia Judiciária registou novamente uma “diminuição considerável” comparativamente ao ano judicial anterior, “podendo e devendo ser melhorada”.

Por outro lado, a coadjuvação pela Polícia Nacional (PN) “na maior comarca do país”, onde se regista 73% da pendência nacional, registou “uma diminuição acentuada, pese embora a instalação da Direção Central de Investigação Criminal no decurso do ano judicial anterior” e o pessoal afeto, em regime de exclusividade, à investigação criminal nos núcleos e serviços de investigação criminal da PN “continua manifestamente insuficiente”.

Excesso de formalismo atrapalha resolução de litígios

O Conselho Superior de Magistratura Judicial (CSMJ) admite, no seu relatório anual sobre a situação da justiça, que as regras processuais e tradições legaissistema jurídico cabo-verdiano “é demasiadamente marcado pelo formalismo”, que privilegia o processo pelo processo, em detrimento de uma abordagem orientada pelos resultados e célere resolução dos litígios.

Considera, por outro lado, a modernização e sofisticação legislativa, no sentido da convergência técnica e normativa com a União Europeia, pode ser considerado o grande motor do ordenamento jurídico nacional, no entanto, muitas vezes, não acompanhada dos respetivos meios para a sua real implementação e aplicação.

O CSMJ reconhece, no entanto, que os recursos financeiros e humanos alocados à magistratura judicial estão, genericamente, alinhados aos padrões médios de países em desenvolvimento, com um aumento substancial nos últimos anos, “com claro impacto no aumento da produtividade dos atores judiciais (magistrados e oficiais de justiça)”.

Para esta entidade, que gere a magistratura judicial, especial atenção deve ser dada ao reforço do serviço de inspeção judicial, como uma unidade central para o bom funcionamento do sistema, assim como a formação contínua dos magistrados, oficiais de justiça e outros funcionários, sem esquecer a especialização orgânica e por cargo. “A má ou subutilização de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) deve ser igualmente tida em consideração”.

Outro aspecto destacado nesse relatório prende-se com a eficiência e eficácia das estruturas de mediação, arbitragem e resolução de conflito que foram criados e integrados no ordenamento jurídico cabo-verdiano, visando, essencialmente, a facilitação do acesso ao direito e justiça, mas também reduzir o fluxo de entrada de processos nos tribunais.

A mesma fonte considera, porém, que, apesar do potencial que esses mecanismos apresentam em termos de resolução célere de litígios, não tem sido bem-sucedida a sua utilização pelos particulares e empresas em caso de litígio, excetuando arbitragens “ad hoc” que têm vindo a ocorrer, particularmente, na área da imobiliária.

“A causa desse insucesso está intimamente ligada aos fatores de resistência cultural à arbitragem, falta de credibilidade social dessas estruturas de mediação e elevado custo processual”, conclui.

Reforço de verbas

O CSMP revela ainda que, por razões financeiras, não conseguiu cumprir, na íntegra, o plano de actividades aprovado. “O plano inicial de inspeção ordinária para o ano judicial de 2021/2022, que previu a realização de 16 inspeções, sendo sete a Procuradores da República e nove às secretarias das Procuradorias da República, não foi cumprido devido, em parte, às restrições orçamentais”.

Também, por razões de natureza orçamental, o plano de formação contínua de magistrados “não foi integralmente executado” e ainda, pelo mesmo motivo o plano de formação para oficiais de justiça e técnicos superiores “foi parcialmente executado”.

Segundo o referido relatório, os oficiais de justiça com responsabilidade de realização de serviço externo de notificação “continuam a deparar-se com enormes dificuldades” de localização dos intervenientes processuais e das suas residências, principalmente nos grandes centros urbanos e, em especial na cidade da Praia.

Este constrangimento, conforme a mesma fonte, vem impossibilitando diligências processuais e obrigando a repetição de sucessivas marcações de diligências, “com implicações diretas não só nos prazos de realização de instrução e na morosidade da justiça, mas também no aumento das despesas com consumíveis e combustível”.

Sem veículos e com computadores velhos

Por outro lado, a frota dos veículos afectos ao MP “carece de reforço e substituição” e mais de 50% do parque informático dos serviços dessa instituição demanda substituição, “por se encontrar obsoleto”.

O relatório revela ainda que os órgãos de polícia criminal “continuam a não poder aceder ao Sistema de Informatização da Justiça, considerando que a esmagadora maioria das queixas e participações são apresentados nesses órgãos e que a eles são delegadas competências investigatórias”.

Para resolver essas carências que impedem o normal funcionamento das procuradorias, o CSMP recomenda o Governo a manter o esforço de investimento realizado no sector da justiça e com especial enfoque no Ministério Público, “por forma a propiciar o aumento da produtividade e a redução da pendência a nível nacional, criando dessa forma capacidade para que a resposta em matéria de exercício da ação penal seja empreendida dentro de prazo razoável”.

A abertura de concursos para magistrados, assim como de oficiais de justiça é outra exigência do CSMP, que também pede o reforço do orçamento, para propiciar o melhor desempenho das suas atribuições.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 789, de 13 de Outubro de 2022

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