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Política

Inspeção à Câmara de São Vicente: Augusto Neves desafia autoridade do Estado

Imagem: MI

Augusto Neves, autarca de São Vicente, foi avisado, mais uma vez, da possibilidade da dissolução dos órgãos municipais, por recusar a acatar as recomendações da averiguação dos factos relacionados com as reuniões do órgão executivo dessa edilidade, feita pelos Serviços de Inspeção e Auditoria Autárquica e da Inspeção Geral de Finanças, por discordar das conclusões do relatório dessa inspeção. Neves diz-se “tranquilo” e a esperar pelo pronunciamento do Ministério Público.

Diante da recusa reiterada do autarca do Mindelo, os Serviços de Inspeção e Auditoria Autárquica (SIAA) deu mais um ultimato a Augusto Neves, lembrando-lhe que a CMSV deverá cumprir com as recomendações do relatório no que se refere à retoma da normalidade na realização das reuniões ordinárias. Isto tendo em conta que, por este facto, se encontra em situação de “ilegalidade grave reiterada”, o que nos termos do artigo 133º do Estatuto dos Municípios, “poderá levar à sua dissolução”.   

Perante o desacato de Augusto Neves, segundo fontes do A NAÇÃO, o Ministério da Coesão Territorial vai solicitar a intervenção do Ministério Público no sentido de promover a declaração de nulidade das deliberações tomadas no dia 2 de Janeiro e nas reuniões subsequentes, referenciadas no relatório de averiguação. 

O SIAA garante, por outro lado, que a averiguação foi realizada de acordo com as normas, métodos, normas e técnicas realizadas em ações dessa natureza tendo em vista a execução “com qualidade e eficácia, e teve como objectivo a verificação dos factos denunciados, através de análise documental e audições”.

Augusto Neves diz-se “tranquilo”

Numa conferência de imprensa realizada esta semana, no Mindelo, Augusto Neves disse, em relação ao impasse que reina na CMSV, estar tranquilo, porquanto a sua equipa trabalha e a Câmara funciona com tranquilidade.

“O que a lei nos exige e nos compete, como presidente da CMSV, temos feito e a tempo. Temos o Relatório de Actividades que apresentamos em Fevereiro/Março, de acordo com a lei; temos a Conta de Gerência de 2021 elaborada e o Plano de Actividades e Orçamento para 2023. Realizamos todas as reuniões quinzenais de Janeiro a Setembro. E temos todas as agendas de trabalho”.

“Agora, se os vereadores da oposição não as aprovam, a responsabilidade é deles”, declarou, realçando que esta é uma situação que já está a nível do Ministério da Coesão Social e do Ministério Público, para análise das deliberações ou outra decisão, consoante a lei. 

Um braço-de-ferro que promete

Por trás de mais este conflito entre Augusto Neves e os vereadores da oposição (UCID e PAICV) está, recorde-se, a averiguação dos factos relacionados com as reuniões da CMSV. A equipa de inspeção concluiu que, durante o ano de 2022, a Câmara “não realizou efetivamente nenhuma sessão”, o que à luz do artigo 134º dos Estatuto dos Municípios constituiu uma “ilegalidade grave” suscetível de gerar a dissolução deste órgão municipal, nos termos da lei.

O referido relatório considerou ainda que a não realização das sessões da Assembleia Municipal para apreciação do relatório das actividades e das contas de gerência da CMSV constitui, ao abrigo do referido artigo do Estatuto dos Municípios, uma “ilegalidade grave”.

Este incidente é justificado pelo facto de a CMSV “não ter cumprido” com os trâmites legais desses instrumentos como determina a lei. Ou seja, esses documentos devem ser submetidos à Câmara, antes de serem apreciados pela Assembleia Municipal.

Em relação às reuniões consideradas nulas, a equipa de inspeção concluiu que a sessão agendada para o dia 30 de Dezembro de 2021 foi “irregular”, uma vez que o e-mail pelo qual o vereador Albertino Graça foi convocado faltava uma letra e, “consequentemente, a convocatória enviada no e-mail não chegou ao seu destinatário”.

Em relação à sessão ordinária de 2 de Janeiro de 2022, o relatório realçou que, apesar da “incongruência” na convocatória quanto à indicação do número da sessão, como vigésima, ao invés de primeira, “a convocatória era válida, na medida em que anunciava expressamente o dia e os pontos a serem tratados na reunião”.

Ainda em relação a essa mesma reunião, a equipa de inspeção estranhou algumas situações que reconheceu “não constituírem ilegalidades”, mas “são anómalas” ao funcionamento da Câmara.

Está em causa o facto de essa reunião ter sido convocada para um domingo, sobretudo tendo em conta que alguns vereadores terem requerido a sua alteração para o dia seguinte, segunda-feira, ou então para quinta-feira, que é o dia, segundo as actas, em que normalmente se realizam as sessões da CMSV.

Para além disso, não se justificou a urgência para convocar sessão da Câmara num domingo e nem se comunicou ao pessoal de apoio, porteiro, técnico das gravações, etc.

O relatório diz que, segundo o e-mail da secretária municipal, Elisangela Soares, a mesma foi informada por Norina Morais Santos, que secretariou a reunião, a ausência do pessoal de suporte técnico deveu-se ao facto de o presidente da Câmara ter considerado que não havia necessidade de tal comunicação.

Contudo, apesar de essa reunião ter tido quórum exigido para funcionar, as deliberações tomadas nessa sessão pelos quatro dos nove membros da CMSV “não tem efeito legal”, porquanto “não teve quórum deliberativo exigido”, ou seja, “seria necessário que pelo menos cinco membros tivessem deliberado”. 

Deliberações devem ser declaradas nulas por Augusto Neves

Para sanar o problema da legalidade dos actos da CMSV, a equipa de acção de averiguação dos factos relacionados com as reuniões da Câmara tinha recomendado ao presidente Augusto Neves a declarar nulidade das deliberações tomadas na reunião do dia 2 de Janeiro de 2022, com a inobservância do quórum deliberativo exigido por lei. Do mesmo modo, deve, igualmente, declarar a nulidade das deliberações tomadas nas reuniões realizadas apenas com os vereadores da UCID e do PAICV.

Num prazo máximo de 10 dias, a partir da data do recebimento do relatório, que foi entregue na CMSV no dia 24 deste mês, Augusto Neves deveria disponibilizar ao Serviço de Inspeção e Auditoria Autárquica, do Ministério da Coesão Territorial, as informações que comprovassem a implementação das recomendações.

A equipa de inspeção apelou ainda à CMSV no sentido de retomar a normalidade na realização das reuniões, nos termos do estabelecido no Estatuto dos Municípios e que seja resolvida a questão das deliberações tomadas nas reuniões realizadas durante este ano, principalmente no que tange à aprovação do relatório de actividade e contas de gerência dessa autarquia.   

Desafio continua

Por aquilo que fez saber esta semana, Augusto Neves não se mostra inclinado a aceitar, por ora, as recomendações do SIAA, dizendo preferir esperar pelo pronunciamento do Ministério Público. Como disse, ele e os seus dois vereadores estão tranquilos.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 788, de 06 de Outubro de 2022

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