Arlindo Vicente Silva, 83 anos, Combatente da Liberdade da Pátria, diplomata e decano dos advogados de Cabo Verde, faleceu esta terça-feira, em Lisboa, vítima de doença. O seu funeral acontece Domingo, 04, na Calheta de São Miguel, sua terra natal.
Vítima de doença prolongada morreu, esta terça- -feira, em Lisboa, o advogado, diplomata e Combatente da Liberdade da Pátria, Arlindo Vicente Silva.
Como advogado, juntamente com o falecido Felisberto Vieira Lopes, defendeu vários presos políticos cabo-verdianos e angolanos.
Enquanto combatente nacionalista, mobilizado desde o início da década de 1960, ainda no liceu em São Vicente, Baco, ou Lindinho, como era tratado pelos conterrâneos de São Miguel, ilha de Santiago, actuou sobretudo na “frente interna” (clandestinidade), juntamente com Jorge Querido, Manuel Rodrigues e outros militantes dessa altura do PAIGC, Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde.
Em 1974, aquando do 25 de Abril (data do derrube da ditadura de Salazar e Caetano, em Portugal), Arlindo Vicente Silva participou juntamente com os seus dois colegas advogados Felisberto Vieira Lopes e David Hopffer Almada, no processo da libertação dos presos políticos na prisão do Tarrafal.
Deputado do PAICV pelo círculo eleitoral de São Miguel
Vicente Silva foi, igualmente, deputado pertencente à lista do PAICV, pelo círculo eleitoral de São Miguel, no mandato de 2001 a 2006. Concluído esse mandato, praticamente deixou de ter vida política partidária. Desligou-se também da advocacia, passando a dedicar-se à agricultura, a grande paixão da sua vida.
Doente há já algum tempo, o extinto foi há alguns meses evacuado para tratamento médico em Lisboa, Portugal. E foi aqui que a morte acabou por o encontrar. O seu corpo, segundo um familiar, vai ser trasladado para Praia, no sábado, devendo ser dado à terra no Domingo, às 16h30 na Calheta de São Miguel, o lugar deste mundo em que se sentia verdadeiramente bem.
Personalidade “inteligente e destemida”, recorda Luís Fonseca
Nas redes sociais, amigos e conhecidos prestam, por estes dias, a sua homenagem a Arlindo Vicente Silva.
O diplomata e também Combatente da Liberdade da Pátria, Luís Fonseca lembra, a propósito, o extinto como “um patriota dedicado, um amigo cordial e profissional conceituado, que muito contribuiu para o nascimento da República”.
Fonseca caracteriza aquele combatente e cidadão como uma personalidade “inteligente e destemida”, narrando que “assumiu sem qualquer custo, mas com risco muito elevado, a defesa de presos políticos durante o período colonial fascista, de entre eles dois companheiros meus, o Lineu Miranda e o Jaime Schoffield no processo que nos foi intentado pela PIDE no seguimento da nossa prisão em Santo Antão, Praia e S. Vicente, em 1967”.
E relata ainda que Arlindo Vicente, enquanto “militante ativo do PAIGC na clandestinidade, foi frequentemente portador de mensagens de encorajamento da organização do Partido que muito nos ajudou a suportar o encarceramento. Foi com ele que o nosso grupo na prisão organizou uma grande distribuição de panfletos em várias ilhas no fim do ano de 1968”.
Defesa e libertação dos presos políticos caboverdianos e angolanos
O decano dos advogados de Cabo Verde foi, como lembra também Luís Fonseca, quem defendeu esse mesmo grupo no Tribunal Militar que aconteceu em Julho de 1969, na Praia.
Fernando dos Reis Tavares (Toco), José Maria Ferreira Querido e Gil Querido Varela foram também presos políticos defendidos por Vicente Silva, em 1970.
Esse julgamento, em São Vicente, ficou célebre na altura. Absolvidos, os réus acabaram carregados nos ombros pelos populares, deixando a PIDE (polícia política) irritada.
Os presos do caso Pérola do Oceano foram também defendidos por Arlindo Vicente Silva e Felisberto Vieira Lopes, tidos como os advogados dos “terroristas” em Cabo Verde. Tanto assim que entre os seus clientes estavam os combatentes angolanos reclusos no Tarrafal.
Um deles, Justino Pinto de Andrade, escreveu: “Mais um Combatente que nos deixa: Arlindo Vicente. Um dos Advogados que nos foi libertar do Campo do Tarrafal, no dia 1 de Maio de 1974. Nunca esquecerei esse momento SUBLIME!”
Recorde-se que, além de Combatente da Liberdade da Pátria, diplomata e decano dos advogados de Cabo Verde, Arlindo Vicente Silva foi antigo Deputado Municipal pelo Município de São Miguel e um dos primeiros quadros-dirigentes da Administração Pública cabo-verdiana no pós-independência, exercendo funções no Ministério da Justiça, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na Embaixada de Cabo Verde em Angola e na Presidência da Guiné Bissau.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 783, de 01 de Setembro de 2022