PUB

Convidados

Ao Deus de todos os poderes Senhor,

Por: Germano Almeida

Inutilmente tenho procurado os poderes públicos desta terra em busca de uma entidade que se dispusesse a minimamente atentar e talvez comentar a iníqua perseguição a que tem estado sujeito o deputado Amadeu Oliveira por parte dos tribunais nacionais.

Não sei se tens acompanhado com alguma atenção que ele está ilegalmente fechado na cadeia da Ribeirinha em S. Vicente vai para um ano, perante a indiferença de tudo quanto é autoridade e poder neste país. Sempre em nome da soberania e independência dos tribunais que não admitem serem atingidos nem com uma flor.E é assim que não se dão ao trabalho de respeitar qualquer tipo de prazo legal, conscientes da sua soberana impunidade. Por exemplo, Amadeu Oliveira está à espera de decisão de um recurso interposto há mais de 120 dias, quando a lei penal diz expressamente que a decisão não pode ultrapassar trinta dias (artº263ºCPP), o cumprimento de prazos judiciais, sobretudo para os presos, é um imperativo constitucional.E daí a repetição da angustiada pergunta de Juvenal: quem guarda os guardas?

Por exemplo, denunciei já um juiz que está a cometer um grosseiro crime de prevaricação em forma continuada. Porém, infelizmente parece que nunca sou lido por quem de direito ou de poder, pelo menos nesta terra Cabo Verde – razão que me faz dirigir-me a Ti como desesperada deliberação de eventual último recurso.

Sei que foste forte o suficiente para abandonar o teu filho unigénito (pelo menos ele queixou-se disso!); eu não sou forte o suficiente para dizer que o que se passa com o Amadeu Oliveira não é nada comigo, que ele é um mofino que sempre gostou de se meter em arlaços, e agora que se pôs a jeito para ser catchido pela vingança dos juízes, que aguente de boquinha calada.

Não! Tenho pena, mas não sou capaz de ficar calado. O meu estômago, o meu cérebro, todo o meu ser arrepia e revolta-se contra essa violência inaudita, esse procedimento desumano, mas sobretudo desnecessário. Mas confesso-te que admiro e invejo esses homens, intelectuais brilhantes e de opinião, políticos preocupados com o bem geral, advogados, ah, sobretudo os advogados!, que perfeitamente e sem mentir poderiam dizer-se teus colegas nessa divinal força de estômago para assistir indiferentes a uma tão flagrante e cruel perversidade judicial. Eu confesso humildemente a minha fraqueza, não consigo ficar calado diante dessa ignomínia.

  Mas se recorro a Ti é mesmo em petição de desespero. Na realidade esgotei todas as formas que conheço, enquanto cidadão, de denunciar esse abuso que está sendo feito em nome da lei. Acresce que já não posso contar com os poderes do meu Estado que ironicamente se diz de direito. Repara: denunciei um juiz de direito de estar a cometer, não por ignorância, mas de má fé, um crime de prevaricação. É um crime grave, tão grave como aquele de que acusam o Amadeu Oliveira, só que real e não virtual. Se estás a par do direito cabo-verdiano, conhecerás certamente o art. 328º CPenal: “O juiz que, contra o direito e com intenção ou a consciência de prejudicar ou beneficiar alguém, no âmbito dos poderes que lhe são conferidos em processo criminal, proferir despacho ou sentença que tenha por consequência a privação da liberdade de uma pessoa ou a sua manutenção de forma ilegal, será punido com pena de prisão de 2 a 8 anos”.

  Ora, Amadeu está preso, acusado de um crime que não existe: ter ajudado a sair do país um indivíduo que sequer estava preso, estava em sua casa. E pelo menos de acordo com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido a 20.02.21 relativo a um pedido de habeas corpus, …”a limitação da liberdade ambulatória não é suficiente para conferir à pessoa a quem for imposta a condição de preso ou detido”. Mais: a obrigação de permanência em habitação não é o mesmo que detenção.

Portanto, é evidente que Amadeu não auxiliou a fuga de nenhum preso, tanto mais que o visado apresentou o seu passaporte na fronteira e viajou.

Porém, Amadeu tem o azar de ser deputado. E é nessa qualidade que está sendo acusado de ter cometido um crime contra a segurança do Estado.

Esse o primeiro absurdo. O segundo vem do facto de Amadeu ser deputado, ainda hoje em funções, não obstante mais de dez meses na cadeia. Ora como deputado, a possibilidade da sua prisão é legalmente rodeada de cautelas e segurança jurídica. Desde logo, não tendo sido preso em flagrante delito, deve ser primeiro pronunciado por um juiz por certo crime e depois disso suspensa a sua imunidade. Nada disso aconteceu, foi preso como que à toa, sem respeito por nenhuma dessas normativas formalidades essenciais.

Podemos aceitar que os da Assembleia Nacional ignorassem essas necessidades. Já não o juiz de direito que ouviu e prendeu o deputado Amadeu Oliveira. Ele imperativamente tem que conhecer essa lei. Portanto, cometeu propositadamente um crime de prevaricação.

Ora o que é mais espantoso neste país é um juiz em funções ser acusado de um crime dessa gravidade e todos os poderes da República continuarem a olhar pró lado como se isso pudesse ser a coisa mais banal do mundo.

Temos, pois, que aqui na terra o Amadeu está sem hipóteses de se safar, tanto mais que, não confiantes no virtual crime de atentado contra o Estado de Direito que inventaram para obter uma condenação, já surgiu mais uma resma de acusações contra ele, sempre na esperança de que se uma não der nada, outra qualquer há de ajudar.

Não sei se podes ou se queres fazer alguma coisa a favor do Amadeu Oliveira, mas eu tinha que tentar. E deixo tudo nas Tuas mãos e por favor, por tudo que seja sagrado neste e noutro Mundo, não me defraudes, porque dos homens já não espero nada!

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 772, de 16 de Junho de 2022

PUB

PUB

PUB

To Top