Edelquinn Dias Semedo, de 33 anos, é a primeira engenheira marítima em Cabo Verde. Cursou no Egipto e actualmente é a responsável de uma companhia internacional de transporte marítimo, situada no Porto da Praia. Aprendeu, por conta própria, que não há nada como ter o comando da própria vida nas mãos.
Edelquinn Semedo começou a estudar engenharia de construção civil na Universidade Jean Piaget de Cabo Verde, em 2008, e logo, em Janeiro de 2009, foi aprovada num concurso para estudar em Alexandria, no Egipto, no curso de que tanto havia sonhado – engenharia marítima.
Uma profissão que Edelquinn desempenha com determinação, no controlo da casa de máquinas dos navios, nomeadamente, máquinas principais, geradores, bombas, bow thruster, tanques, etc.
“Confesso que até ao 11º ano de escolaridade não tinha sequer conhecimento da existência do meu curso. Aprendi sobre o mesmo, em uma feira de profissões que fizeram quando eu frequentava o 12º ano e de cara me apaixonei pela engenharia marítima”.
Primeira cabo-verdiana
Edelquinn Semedo foi a primeira mulher no departamento de engenharia marítima, na Academia Árabe para Ciência, Tecnologia e Transporte Marítimo (AASTMT), no Cairo, Egipto, um maís de maioria muçulmana, onde ser mulher não é fácil, mormente para uma jovem de uma outra origem e cultura, como é o seu caso.
“Fiz parte de uma turma só com rapazes. Por conta da cultura e do idioma, por vezes, me sentia excluída da turma. Os trabalhos de grupo, no meu caso, acabavam por se tornar em trabalho individual. Mesmo assim, não desisti”.
Chegado ao último semestre do curso, esta cabo-verdiana teve que regressar ao país para fazer o seu estágio e, assim, “cumprir o programa aqui em Cabo Verde, porque na época, as meninas não eram aceites a bordo do navio da escola”.
Apesar das limitações e desafios enfrentados no decorrer do curso, Edelquinn não pensou em desistir em momento algum, tomando como referência uma outra mulher que estudava um curso diferente.
Aliás, Edelquinn afirma que ela não foi a única mulher a estudar na AASTMT, considerando que quem realmente abriu as portas para as mulheres foi uma outra jovem, de nome Fatouma, do Djibuti, um pequeno país no Corno de África.
“Hoje Fatouma se tornou na primeira-piloto mulher do seu país e tive a honra de compartilhar minha experiência universitaria com ela. Assim como eu, Fatouma também teve de fazer o seu estágio fora do Egipto para poder seguir com os estudos e graduar-se como oficial de ponte. Já no meu caso, graduei-me como oficial de máquinas”.
Nessa trajectória, várias foram as inspirações e influências que serviram como factores de motivação para a nossa entrevistada na altura. “Há 13 anos, ser a primeira mulher a entrar naquele departamento me fazia sentir como um alienigena, mas hoje prevalece um sentimento de superação”.
Acrescenta ainda que, nisso tido, a sua maior motivação foi sempre a sua família. “Por um lado, sempre quis que os meus pais sentissem orgulho de mim. E, por outro, sendo eu a irmã mais velha, quis ser o exemplo para as mais pequenas, então, falhar estava fora de questão”.
A força da mulher nos sectores marítimos
Contando com passagens por vários barcos, nomeadamente, Kriola-Fast Ferry, Padre Benjamim, Iron Bull e Pentalina, Edelquinn Semedo diz que a vida no mar não é nada fácil. A persistência, a paciência, a entrega e a capacidade de trabalho em equipa são algumas das características que se tornam fundamentais para se trabalhar no sector marítimo.
“Para além dos desafios naturais, temos que lidar com desafios psicológicos. São grupos de pessoas convivendo, boa parte do tempo, em espaços restritos. E temos de levar em conta que a vida no mar não para, não importa a data. A prova disso foi o papel que os marítimos tiveram durante a pandemia”.
“Quando todas as fronteiras se fecharam”, lembra, a propósito, “os nossos marítimos foram os heróis escondidos que garantiram que alimentos, equipamentos de proteção, combustíveis… chegassem às nossas lojas, aos hospitais, farmácias, postos de combustíveis e todos que necessitavam de cargas”.
Hoje, Edelquinn Semedo diz sentir-se realizada profissionalmente e satisfeita consigo própria. “Na minha área, para se conseguir o posto que tenho actualmente, um homem teria de ter uma vasta experiância ligada ao sector marítimo e com o mínimo de 40 anos. Conseguí a minha posição, com trinta e poucos anos, sendo mulher e mãe”.
Com isso, esta jovem cabo-verdiana, engenheira marítima, de formação e profissão, assegura que “não há limites para os nossos sonhos”, e por isso recomenda a outras mulheres, como ela: “Não deixe ninguém estabelecer limites para si. Tome o comando da sua vida nas próprias mãos, e seja você a estabelecer o que quer ser na vida”.
Por: Tiana Silva
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 762, de 07 de Abril de 2022