Por: Filinto Elísio
O que é Flash afinal? Arménio Vieira, o poeta por quem apelo haja uma estátua de “Drummond ou de Pessoa”, na Praça Luís de Camões (Praia, Cabo Verde), perguntara: “Quem sentiu mar?” Numa frase – e sem querer dar ares de complexidade -, Flash é um salvo-conduto para eu escrever o que me der na veneta. Vir aqui com o ser ou não ser, essa coisa shakespeariana, poderá ser uma precipitação. Arménio Vieira, ele-poeta já foi lesto naqueles versos, a intuir “Não o mar azul/ de caravelas ao largo/ e de marinheiros valentes”…
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Flash também pode ser uma vénia de sempre ao meu irmão Antero Simas, primogénito do meu pai, agora aniversariante, que me ensinou a andar de bicicleta na Pracinha do Liceu e a nadar no Penedão da Praia Negra, que me levou ao Newport Jazz Festival para ver Joe Zawinul e ao Park Street para aprender com os Weather Report como sair da zona de conforto e se manter na estética. Compositor, com os pés em Cabo Verde (Doce Guerra, foi disto ter dito muito), mas amante da música, com as antenas no mundo, aliás legado do nosso Anastácio Filinto, o meu irmão mais velho era (e é, cá está ao vivo e a cores o “zone d’ombre” desta nota) tudo o que sonhei (e sonho, ó incessante mistério) para quando crescer. Parabéns, Mano Velho!
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Para quem se interesse, uma das boas opções para a Política Externa é a de continuarmos “país útil”, através de uma diplomacia mediadora de conflitos e promotora da paz. A tal diplomacia de bons ofícios. Para tanto, impõe-se ampliar o capital-reputação e credibilidade e reduzir o Risco País, assim como consolidar um conjunto de vantagens comparativas – e por que não as dizer competitivas? -, sem as quais as demandas (que las hay) passam ao largo. O Dossier África Austral – tendo Cabo Verde um papel na agenda global na retirada dos Sul-africanos e dos Cubanos de Angola, no desmantelamento negociado do Apartheid e na possibilidade da libertação dos presos políticos, inclusive de Nelson Mandela, e na Independência da Namíbia -, foi, na minha modesta opinião, um dos exemplos de êxito diplomático de Cabo Verde, facto de resto que nos consagrou, de então, como “país útil” na arena internacional.
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Nesse Dossier, Cabo Verde pôde ajudar, dentro das suas possibilidades, a construir, nos anos Oitenta, pontes onde quiçá alguns outros, por razões gravosas e circunstâncias que se depreendem, estivessem impedidos de o fazer. O tornar Cabo Verde membro do Comité Ad Hoc da Organização da Unidade Africana para a África Austral, com o aval dos Países da Linha de Frente (Angola, Botswana, Moçambique, Tanzânia, Zâmbia e Zimbabwé), foi corolário de tal utilidade reconhecida. E, já agora, não terá sido por acaso o batismo posterior do Aeroporto Internacional da Praia com o nome de Nelson Mandela…oportunamente, um livro a vir, da autoria de uma grande personalidade cabo-verdiana. Aliás, sobre isso, leio um post do amigo Jorge Tolentino, que diz (…) já como Ministro da Presidência do Conselho de Ministros, fui incumbido pelo Primeiro Ministro, Dr. José Maria Pereira Neves, de intervir no processo de atribuição do nome de Nelson Mandela ao Aeroporto Internacional da Praia. O Comandante Silvino da Luz foi um ‘major player’ nesse processo (…).
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Cabo Verde tem algumas condições a serem otimizadas, desde logo a sua localização geoestratégica. É um Pequeno Estado Insular, que não ameaça nem periga a comunidade internacional. Aliás, um país não beligerante, como escreveu Renato Cardoso em “Cabo Verde – Opção por uma política de paz” (Instituto Caboverdiano do Livro). É hoje, por honra coletiva, considerado um Estado Democrático de Direito, com Governabilidade e Estabilidade, com um povo espalhado pelas ilhas e pelo mundo, ciente do ouro que é “Terra di paz/ terra di gozo”, como reza uma das gloriosas mornas de Jotamonte.
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Em “closings”, insistir que genial mesmo era o poeta Carlos Drummond de Andrade ao descobrir que se chamasse Raimundo “seria uma rima, não seria uma solução.”
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 741, de 10 de Novembro de 2021