Por: Arsénio Fermino de Pina*
Uma das empresas farmacêuticas produtoras de vacinas anti-Covid apresentou um “estudo” que aponta para a necessidade de uma terceira dose da vacina para reforçar a sua acção, visto se ter constatado uma baixa acentuada da taxa de anticorpos, umas semanas após a segunda dose. Essa constatação e conselho levaram a que a comunicação social espalhasse, com grande alarido a notícia da necessidade de uma terceira dose da vacina, com entrevistas a pessoas que nada ou bem pouco percebem de Medicina, levando, pelo alarme, alguns países a adoptar o conselho da farmacêutica como verdade irrefutável.
Todavia, a informação/conselho da farmacêutica é incorrecta e suspeita de ser interesseira: incorrecta porque é do conhecimento científico que, após todas as vacinações (as segundas e terceiras doses), ao cabo de seis meses, as taxas de anticorpos circulantes no sangue começam a baixar sensivelmente, e outra coisa não seria de esperar, visto que seria um desperdício do sistema de defesa continuar a produzir anticorpos sem necessidade. Portanto, – e isso, médicos e outros cientistas que estudaram e percebem do assunto, já confirmaram, sem a comunicação social comunicar, com igual alarido o facto científico – não é a manutenção de taxas altas de anticorpos que atestam a eficácia de uma vacina, mas antes a chamada memória imunológica do sistema de defesa do organismo beneficiado com vacinação, a qual, face a uma nova infecção ou a administração de nova dose de vacina, dá o alarme ao sistema de defesa, começando este imediatamente a produção de anticorpos. Escrevi, sem nunca ter lido nem ouvido ninguém falar nisso, interesseira da farmacêutica, dado que, quanto mais vacinas vender, maior serão os lucros.
Não me venham com argumentos de a informação/conselho se basear em estudo de cientistas competentes, porque está provado que, infelizmente, mesmo entre gente capaz de Ciência, há oportunistas desonestos capazes de venderem a sua competência e fama, e algumas empresas farmacêuticas têm um poder económico muito superior ao de empresas perolíferas, o que lhes permite comprar cientistas sem escrúpulos que avalisam tais “estudos” e desinformações.
Outrossim, a Organização Mundial de Saúde (OMS) explicou, logo após a publicação da notícia, que não havia confirmação científica quanto à baixa da eficácia das vacinas após a segunda dose, pelo que não lhe parecia necessária uma terceira dose, que seria um desperdício, devendo reservar-se essa sugerida dose para o início da vacinação de populações dos países com poucos recursos para a compra de vacinas.
Relativamente às pessoas que entre nós, e também noutras paragens, são contra as vacinas, por ignorância ou motivos religiosos (geralmente de seitas religiosas, do tipo das evangélicas), seria bom que se lembrassem do número de crianças que contraiam tétano umbilical, tosse convulsa, paralisia infantil, sarampo e morriam, antes da existência do Programa de PMI/PF instituído depois da independência, que instituiu um programa nacional de vacinações, antes inexistente. Sei que a certas pessoas com crenças não adoptadas de forma racional, não se consegue tirar racionalmente das suas crenças. Contra isso, ou melhor, prevenindo isso, somente promovendo, bastante cedo na vida, a cultura científica, de modo a aprenderem a discutir de forma construtiva e serena, a pesar argumentos e a medir riscos. Sem isso, nenhum dos nossos problemas presentes e do futuro próximo será resolúvel.
Parede, Agosto de 2021
*Pediatra e sócio honorário da Adeco
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 729, de 19 de Agosto de 2021