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O efeito da passagem do estado de calamidade pública a contingência na economia

Por: Pedro Ribeiro

Decididamente, em Cabo Verde o problema são os outros – e o “sistema”, claro. Que é uma espécie de outro gigante que serve de desculpa para tudo.

A verdade é que alguns são mais inteligentes do que outros e bem-sucedidos do que outros, e objetivamente, deve ser isso que irrita tanto aqueles que não conseguem aliar a sua falta de ética a um sistema tão protegido e incompreendido.

E a pandemia-, conhecida de todos pelos seus efeitos já não pode continuar a ser desculpas para tudo! Qualquer um dos três estados – alerta, contingência ou calamidade – pode ser adaptado a qualquer parcela do território. Nos três casos, quem for apanhado a desobedecer ou a resistir às ordens das autoridades é punido com crime de desobediência, previsto no Código Penal, mas com as respetivas penas agravadas em pena de prisão e pena de multa.

Foram desenhados para fazer face a uma catástrofe ou acidente grave. Foram também pensados para serem proporcionais aos graus de risco. Isto é, se pensarmos numa pirâmide com três níveis, em que a gravidade da situação aumenta à medida que se sobe de patamar, o topo da pirâmide corresponde à situação de calamidade. O Estado se vê forçado a medidas de caráter excecional, acima deste só os previstos na Carta Magma.

No nível mais baixo da pirâmide, logo, com uma situação menos grave, aplica-se a situação de alerta, que, segundo a lei, é a mais adequada e proporcional a cenários de menor risco.

Estado de calamidade

Dos três, o estado de calamidade é o único que prevê limites ou condicionamentos à circulação ou permanência de pessoas ou veículos nalguns espaços; que prevê a mobilização civil de pessoas, por períodos de tempo determinados; a fixação de cercas sanitárias e de segurança ou, entre outras coisas, a racionalização da utilização dos serviços públicos de transportes, comunicações e abastecimento de água e energia, bem como do consumo de bens de primeira necessidade.

No caso do estado de alerta, cabe ao presidente da câmara municipal declará-lo, se for de âmbito municipal, ou então à entidade responsável pela área da proteção civil, o todo ou em parte do seu âmbito territorial de competência, precedida da audição, sempre que possível, dos presidentes das câmaras municipais dos municípios abrangidos.

A declaração de situação de contingência é da responsabilidade da entidade responsável pela área da proteção civil no seu âmbito territorial de competência, e também precedida, sempre que possível, da audição dos autarcas daqueles municípios.

Já no caso do estado de calamidade. Só o governo pode declará-lo, e tem de o fazer sob a forma de resolução do Conselho de Ministros. Pode, no entanto, ser precedida de despacho do primeiro-ministro e do ministro da Administração Interna, a reconhecer a necessidade de declarar a situação de calamidade.

Acima do estado de calamidade, só pode ser aplicado o estado de sítio ou o estado de emergência, pela primeira vez na história da vida democrática do País. É uma medida extrema de limitação dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, razão pela qual está prevista na Constituição. Aplica-se em casos extremos, já que pode condicionar uma série de direitos fundamentais, como o direito à circulação, à greve, à reunião ou à manifestação.

Direitos fundamentais que não podem ser suspensos

Segundo a lei, só menos de uma dezena de direitos fundamentais não podem mesmo ser suspensos nem mesmo perante a gravidade de um estado de emergência: o direito à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroatividade da lei criminal o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião.

Neste sentido o Governo decretou o estado de calamidade que implica medidas mais restritivas ao nível do horário de funcionamento de estabelecimentos comerciais, restaurantes e bares, mas também a nível de atividades de natureza cultural ou política. Foram reforçadas aplicação de sanções para aqueles que não obedecem o isolamento. Fiscalização reforçada através das Forças Armadas, da Polícia Nacional, Proteção Civil e a IGAE.

Todas essas ações foram para proteger a saúde e a vida das pessoas, evitar o colapso do sistema de saúde e proteger o emprego e o rendimento das pessoas, bem como a economia.

Passagem a estado de contingência

Ainda na semana passada, o Governo decidiu pela passagem a estado de contingência. As novas regras estão em vigor desde a última sexta-feira, 30 de julho do corrente, que o país está em estado de contingência para aumentar o grau de prevenção e combate à Covid-19. Isso levou o governo a impor a obrigatoriedade de os empregadores procederem a algumas alterações.

Além disso, o empregador deve ainda proporcionar ao trabalhador condições de segurança e saúde adequadas à prevenção de riscos de contágio. Será ainda possível e aconselhado adotar o regime de teletrabalho, nos termos previstos no Código do Trabalho – caso que será obrigatório quando requerido pelo trabalhador, independentemente do vínculo laboral e sempre que as funções em causa o permitam.

Novo plano de desconfinamento

Admitiu-se, no entanto, a possibilidade de antecipar algumas das medidas do novo plano de desconfinamento, se o ritmo da vacinação for mais rápido (vacinar 70% da população ate set/out), mas também não afasta a necessidade de recuar se a situação epidemiológica se agravar. Todavia, o Governo deve definir, conceber e publicitar, tão cedo quanto possível, o novo plano de desconfinamento, constituído por fases que acompanham o ritmo esperado do plano de vacinação contra a covid-19, mantendo uma monitorização permanente da evolução da pandemia.

Neste espirito, temos de continuar a adotar as medidas de proteção individual, são absolutamente indispensáveis para continuarmos a controlar a pandemia. Não me lembro de um tempo tão insipido em matéria económica como este que atravessamos.

Há um fosso maior entre as economias avançadas e emergentes. Escassez de recursos tornou-se mais grave. Numa altura em que se diminui as restrições, a economia foi retomando a sua atividade, e o PIB sofrerá uma subida, certamente.

Sinais animadores de recuperação da economia

Já há sinais de recuperação animadores da economia. Esta evolução é influenciada por um efeito base, uma vez que as restrições sobre a atividade económica em consequência da pandemia se fazem sentir de forma mais intensa nos próximos meses.

Haverá um contributo positivo da procura interna que se acentuará. O contributo da procura externa liquida será menos negativo, traduzindo sobretudo o aumento mais significativo das exportações de bens. As expetativas de investimento serão revistas em alta por parte do setor empresarial.

Entretanto, há situações evidentes de evasão e fraude fiscal de elevada complexidade. Neste sentido, a inspeção tributaria deve ser autorizada a aplicação da clausula geral antiabuso-, mecanismo que a lei prevê que a Administração Fiscal intervenha sempre que detete operações de planeamento fiscal abusivo.

Por ca, o país continua desigual (175 mil pobres e 115 mil pessoas a viverem na extrema pobreza), pois torna-se necessária a avaliação das politicas públicas para saber o custo de oportunidade ali ou acolá. Urge diversificar e modernizar a nossa economia, pois há excessiva dependência face ao turismo. Urge capitalizar empresas e mobilizar mais e melhores investimentos e reformas essenciais para relançar a economia. Para isso há que se desenvolver competências digitais e lideranças ágeis, apostar em industrias modernas (economias azuis, economias verdes, negócios criativos e sociais, transição digital e objetiva …), e serem mais resilientes face a estes choques externos e exógenos.

Alargar a cobertura de pensão de sobrevivência, atender e assegurar os cuidados necessários as pessoas com necessidades especiais. Um programa de apoio aos estudantes dos cursos técnicos, profissionais e universitários deve ser assegurado, sob pena de desistência destes e descontinuação de certos cursos.

Tudo isso se consegue com a forte retoma económica, e a massificação e o controlo da situação pandémica, e aumento de medidas de proteção social dirigida e eficiente, seja possível ultrapassar a estimativa de crescimento.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 727, de 05 de Agosto de 2021

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