Devido à criminalidade reinante, os moradores da Achada Mato, na cidade da Praia, clamam por uma esquadra de polícia. Com isso esperam ter de volta a paz e a segurança que antigamente reinavam no bairro.
Tiros nocturnos, brigas e barulho de pedras e garrafas tiram a paz todas as noites a quem vive na Achada Mato. Uma comunidade situada a escassos quilómetros do centro da cidade da Praia entre os bairros de Castelão e Jamaica, perto também do Quartel Militar Justino Lopes.
Maria do Rosário Alves, doméstica, 63 anos, lamenta o clima de vandalismo e criminalidade, associado à falta de respeito dos jovens para com os mais velhos.
“Tiros a toda a hora”
“Antigamente, Achada Mato era um lugar óptimo de se viver, em tempo de calor deitávamos na rua até o amanhecer, hoje temos medo até de estar dentro da nossa própria casa. Há muito barulho de pedras e garrafas e tiros a toda a hora. Além disso, estamos num tempo em que os jovens não respeitam os mais velhos, por isso precisamos de mais autoridade na zona para colocar ordem e segurança”, apela.
Achada Mato está a tornar-se um perigo não só para os moradores, mas também para quem trabalha no bairro, como é o caso de Renato Semedo, 53 anos, que presenciou de perto o desenvolvimento da comunidade e os problemas que vieram a surgir posteriormente.
Esquadra policial é uma prioridade
“Trabalho no bairro há 23 anos e, na minha opinião, ainda há muito a ser feito em Achada Mato. No entanto, a prioridade deve ser a criação de uma esquadra policial de modo a proporcionar segurança a quem vive e trabalha aqui”, sugere.
Semedo ainda afirma que a Polícia Nacional passa pela zona de vez em quando e nem sempre que é chamada aparece por causa do nível de criminalidade do bairro.
“A violência está por toda a zona, os jovens (‘thugs’) vêm do Castelão e da Jamaica, fazem guerra e delinquência por todo o bairro”, conta.
Na mesma linha, Kevin Alves, estudante de 19 anos, afirma que Achada Mato tornou-se um lugar perigoso para se estar e viver.
“Não temos segurança e por isso pedimos pelo menos uma esquadra policial. A Polícia, quando chamada, vem, mas demora horas para vir, e quando chega os problemas, como guerras entre os gangues, já acabaram. À noite, os assaltos são frequentes”, relata.
Polícia Nacional nega as acusações
Fernando Tavares, comandante da Esquadra de Polícia da Achada de São Filipe (responsável por fazer a cobertura na Achada Mato), refuta as acusações dos moradores sobre a actuação da PN quando solicitada.
“Não é verdade que a PN não aparece nas ocorrências na Achada Mato, além disso, sempre fazemos ronda pela localidade. Quando muito, às vezes, pode haver um pouco de atraso até a Polícia chegar ao local do ocorrido, por causa de outras prioridades e casos mais urgentes”, explica.
Tavares afirma ainda que a maioria das ocorrências para as quais a PN é chamada tem a ver com conflitos entre familiares ou vizinhos, do bairro, e nestes casos a PN pouco pode fazer.
Relativamente às guerras entre as gangues, o comandante afirma que nos últimos tempos a PN não tem registado nenhum conflito do tipo, além disso, como salienta, quem responde por esse género de ocorrência é o serviço de Piquete, que está mais preparado e treinado para isso.
Fernando Tavares, além de comandante da Esquadra de Polícia de Achada São Filipe, é também morador da Achada Mato e reafirma não ter constatado nos últimos tempos guerras de gangues, porém, diz-se ciente dos assaltos que são feitos pontualmente no bairro e não só. Coisa, como deixa a entender, não é exclusivo daquela zona da capital.
Associação Comunitária na linha de frente do combate à criminalidade
O presidente da Associação Comunitária de Achada Mato (ACAM), Eliseu Pires, afirma que a criminalidade e a violência juvenil estão a afectar tanto esse como outros bairros da capital.
“Eu digo que o problema são os próprios jovens, isto é, o que os leva a escolher o caminho da violência quando podem, com a mesma energia, seguir por uma outra via”, começa por dizer.
“A ACAM deu a todos os jovens da zona várias oportunidades. Eu próprio, como técnico de construção civil, sempre chamo os jovens para irem trabalhar, portanto, não é só falta de oportunidade”, revela.
“Para combater esses problemas, a Associação tem estado a correr atrás, junto de parceiros, através de várias formações, mas são poucos os jovens que aderem. Muitos não ligam simplesmente e nós estamos cientes disso”, sublinha.
Eliseu Pires declara ainda que a criminalidade não está a diminuir, em Achada Mato nem noutros bairros, dado que o crime não é devidamente combatido pelo sistema judicial e isso faz com que os criminosos não tenham mais medo ou respeito pelas autoridades.
“Mesmo que a presença da Polícia Nacional seja frequente, a criminalidade continua. As pessoas que estão no mundo do crime estão identificadas, o jovem que já entrou e saiu da cadeia quatro vezes ou mais, já não tem medo de nada, e o pior de tudo é que ele consegue colocar outros jovens no mesmo caminho”, expõe.
Defendendo os interesses da comunidade, o presidente da ACAM diz que, apesar de tudo, a prioridade da associação é lutar contra a criminalidade e tornar Achada Mato de novo num bairro de paz, tranquilo e seguro, onde as pessoas não têm medo de ir viver.
A Associação Comunitária de Achada Mato é constituída por 17 voluntários e surgiu em 2000, isto é, já conta com 21 anos de existência.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 725, de 22 de Julho de 2021