Longe da família, deixada em Cuba, perto dos cabo-verdianos, num ano particularmente difícil de luta contra a covid-19. A 23 de Abril chegava ao Aeroporto Internacional Nelson Mandela um grupo de 20 profissionais de saúde pública para ajudar Cabo Verde a enfrentar um dos vírus mais letais de que os tempos modernos têm conhecimento.
A 23 de Abril de 2020 um grupo de 20 profissionais de saúde, oriundos de Cuba, desembarcavam no Aeroporto da Praia para ajudar Cabo Verde a combater a pandemia da covid-19. Na altura o país registava os primeiros casos da doença. Um ano depois, a equipa destacada na Praia olha para trás e fala de uma luta dura, mas também de aprendizado e partilha com os colegas cabo-verdianos.
Num total de 20 integrantes, a “Brigada Henry Reeve” é composta por médicos, enfermeiros intensivistas e epidemiologistas, distribuídos por cinco pontos do país: Santiago Norte, Praia, São Vicente, Sal e Boa Vista.
Depois de passar por um período de quarentena obrigatória, o trabalho de campo começou a 14 de Maio, sobretudo para reforçar a equipa em Cabo Verde e somar ao trabalho dos profissionais de saúde, com um objectivo em comum: combater uma doença que na altura ainda era praticamente desconhecida e sobre o qual pairavam muitas dúvidas e incertezas.
Segundo a chefe da brigada, Maria Caridad Pérez Matute, o contrato inicial era de oito meses, entretanto, completado o primeiro ano, a intenção é ficar enquanto a sua presença não seja mais necessária no arquipélago.
“Estamos a trabalhar em outra realidade, num país com 45 anos de história e cooperação com Cuba, com a presença de médicos cubanos aqui, como também de médicos cabo-verdianos em Cuba. É uma partilha, pois assim como ajudamos nós também aprendemos o saber do outro e outras formas de enfrentamento”, sublinha.
A equipa fala da boa relação com os colegas cabo-verdianos, principalmente com os formados em Cuba, com quem formam uma “grande família”. “Vamos estar aqui durante o tempo que o nosso povo irmão precisar, sempre dispostos a ajudar e a dar tudo de nós”, exalta Maria Caridad Pérez Matute.
Quando a equipa chegou a Cabo Verde, o epicentro do vírus estava na ilha da Boa Vista, cerca de um mês após o surgimento do primeiro caso, na mesma ilha. Entretanto, segundo diz, era expectável que ele se alastrasse para as outras ilhas, como estava a acontecer em outras partes do mundo. Entretanto, mesmo com o agravamento que se veio registar, ressalva que o trabalho de equipa “permitiu que a mortalidade não fosse um grande problema e que não houvesse um colapso” do sistema de saúde.
“Tudo isso graças também a todas as diretrizes internacionais da Organização Mundial da Saúde. Nós, que viemos de Cuba, não fizemos nada de extraordinário senão seguir aquilo que estava protocolado”, explica.
Para Cabo Verde, a equipa trouxe consigo experiências, não só do seu país de origem, mas de vários outros onde tem prestado o seu serviço, no âmbito da cooperação internacional. Tudo isso, sublinha, permite um conhecimento muito maior, o que faz com que o balanço seja sempre muito positivo, tanto para eles, como para os companheiros cabo-verdianos.
Combate deve ser de todos
Em termos epidemiológicos, a especialista Tania de la Caridad Gómez Padrón, afecta à Delegacia de Saúde da Praia, ressalta que aqui, na capital, não está no seu melhor momento de pandemia com a nova vaga que se faz sentir.
“Quando chegamos havia dois ou três casos, e neste momento a situação é muito desfavorável, o que pode estar relacionado com aquilo que acontece em outros pontos do mundo, que é a presença de outra mutações do vírus”, pressupõe.
“Humildemente, digo ao povo de Cabo Verde que a covid-19 não exceptua ninguém, afecta a todos, de forma geral, e que não a há combate mais eficiente do que as medidas sanitárias que estão protocoladas, que todos conhecemos e muito pouco cumprimos”, reforça.
Por isso, alerta, toca a cada um de nós cumprir, estrita e obrigatoriamente, todas as medidas que estão desenhadas para o efeito, como sendo a única forma de enfrentar a situação.
Um ano difícil
Para o médico intensivista Orel Lopéz Iglesia, fica para trás um ano difícil, de muito trabalho e de muitos sacrifícios. Um ano longe da família, dos amigos, quase sem nenhum tempo de descanso. Mesmo assim, tudo isso é compensado pela satisfação de estar a salvar vidas.
Na mesma linha, o colega Lárazo Hernández Martínez, membro da brigada e enfermeiro intensivista, que presta serviço no Hospital Agostinho Neto, fala de um ano “duro”, mas enriquecedor, especialmente por poder beber de uma cultura distinta, num país também distinto.
Homenagem
Em jeito de agradecimento pelo serviço prestado até agora, a Associação Cabo Verde Amigo de Cuba (CAMICUBA), está a organizar uma homenagem dirigida à Brigada Henry Reeve, que deverá ter lugar no próximo dia 24 de Abril, na Assembleia Nacional.
“Sabemos que desde que a pandemia da covid-19 alastrou-se pelo mundo, todos os países têm concentrado os seus esforços para que o pessoal de saúde e outros, estejam voltados para trabalhar no intuito de minimizar os seus efeitos. Contudo, Cuba tem partilhado os profissionais de saúde que tem e a experiência na luta contra catástrofes, calamidades e epidemias com outros países, com ênfase para o continente africano”, realça a associação, segundo a qual o Governo cubano “não só está preocupado com minimizar o efeito da covid-19 no seu território, como também ajudar outros países a se livrarem desta pandemia”.
A ideia é presentear cada um dos 20 profissionais da saúde com um troféu feito em acrílico e um diploma.
Cuba prestes a ser o primeiro país da América Latina a ter própria vacina
Pelo menos duas vacinas estão nas últimas fases de concretização, nomeadamente a Soberana 02 e a Abdala, já na fase final de ensaios clínicos. Neste momento, Cuba vive a expectativa de ser o menor país a produzir seu próprio imunizante contra covid-19 e o primeiro da América Latina.
Cientistas que acompanham os ensaios projectam que, tendo o aval da agência reguladora local, a vacinação massiva da população cubana deverá começar em Maio. Nos próximos meses, o país prevê produzir cerca de 100 milhões de doses e ter toda a sua população vacinada até o final do ano. O plano é também de fornecer para outros países, sobretudo do terceiro mundo.
(Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 712, de 22 de Abril de 2021)