Por: Pedro Pires
Creio não estar a exagerar se considerar a situação por que o mundo está a passar e o nosso pequeno país, também, crítica, conturbada, escorregadiça e de muitas incertezas. Com efeito, são tempos inéditos, diferentes daqueles com os quais temos convivido, mais ou menos bem, ou que já ultrapassámos, tempos que reclamam uma atitude madura e sábia para os enfrentar com probabilidades de êxito, o que, por sua vez, nos recomenda refletir e refletir bastante antes de decidir.
Escolha de objetivos e caminhos a seguir
A escolha de objetivos a realizar e de caminhos a seguir para os alcançar constituem elementos cruciais, constitutivos da tomada de decisão e da probabilidade de obtenção dos resultados almejados.
A programação e a escolha de prioridades constituem outro exercício sensível de gestão, que reclama realismo e inteligência estratégica, pois não se pode baralhar o roteiro nem errar nas sequências de concretização.
Por seu lado, os caminhos fáceis e as soluções ligeiras e descuidadas, a fim de agradar expetativas irrealistas ou de mobilizar apoios efémeros, contribuem para desresponsabilizar as pessoas e as comunidades, afastando-as da situação objetiva e de soluções sólidas e duradouras.
As facilidades não representam escolhas acertadas, especialmente, quando a resposta adequada seria conceber e concretizar soluções viáveis, sólidas e duradouras.
Temos passado por momentos críticos que vêm reclamando dos cidadãos e das lideranças ponderação e maturidade que ajudem a encontrar escolhas e soluções realistas e viáveis em bases sólidas, a fim de se colocar o nosso país a salvo de desenvolvimentos posteriores imprevisíveis e comprometedores de ganhos arduamente conseguidos, pondo os interesses nacionais acima de quaisquer outros.
Amor a Cabo Verde
Neste embate por uma verdadeira salvação nacional, antes de qualquer outro elemento de ordem material ou materialista, deve-se destacar, valorizar e estimular a força anímica que nos tem inspirado: o amor a Cabo Verde.
Com efeito, a mola simbólica e emocional que nos tem impulsionado tem sido o patriotismo. Sem ele, tudo seria mais complicado e nos perderíamos em meandros intricados da gestão de compensações a interesses individuais, de grupos ou de terceiros.
Conjuntura crítica, desafiante e complexa
Não resta dúvida a ninguém que o nosso país está perante uma conjuntura crítica, desafiante e complexa. A sinceridade obriga-nos a reiterar que nos encontramos perante uma crise multiforme de desdobramentos vários: sanitário, económico, financeiro, social e humanitário.
Por todo o lado, a preocupação primeira tem sido, e continua sendo, a erradicação da Covid-19, agora, previsível com uma ampla campanha de vacinação.
A segunda grande prioridade é enfrentar e superar com sucesso a conjuntura “pós-covid-19”. Isto é, reunir as condições e os recursos humanos, materiais e financeiros para relançar a economia, saldar as dívidas públicas e privadas, reequilibrar as finanças públicas e as contas dos bancos e, por fim, restaurar os graves e vastos danos económicos e sociais que vão restar por resolver.
As crises são situações de anormalidade e carregadas de riscos. Requerem, por isso, uma gestão política sábia. Neste sentido, nenhuma liderança avisada deve arrogar-se da veleidade de querer resolver sozinha, e no conforto dos gabinetes, a complexidade da situação e dos desafios por vencer, desconsiderando as contribuições indispensáveis de outros atores políticos, económicos, sociais, culturais e religiosos.
Pelo contrário, os tempos de crises reclamam responsabilidades partilhadas, união, solidariedade e cooperação. Pois, unidos, solidários e cooperativos seremos mais capazes e, certamente, estaremos em melhores condições de vencer os desafios que nos são impostos!
Necessidade urgente de fomento de um ambiente político de diálogo
Por esta e por outras razões, considero que há, no nosso país, a necessidade urgente do fomento de um ambiente político de diálogo, de confiança recíproca, de cooperação e aberto ao compromisso, a fim de se garantir nos próximos tempos a estabilidade política e social, a harmonia nacional e a segurança pública indispensáveis.
Outrossim, estamos em tempo de escolhas políticas, em que caberá a responsabilidade maior aos eleitores que vão decidir. O mais certo é que a situação pós-covid-19 exija uma gestão muito criteriosa, ponderada e rigorosa e, certamente, austeridade no uso e distribuição dos recursos públicos.
A recuperação económica, financeira e social, a seguir, que alguns já chamam de reconstrução nacional, terá que ser sempre uma obra de dimensão nacional, complexa e de longo prazo, compartilhada e sustentada em projetos e programas sólidos e em sectores modernos portadores de novas oportunidades económicas e geradores de mais rendimentos e empregos, a fim de se compensar os destruídos. O sector social exigirá uma atenção muito especial.
Uma nova democracia, participativa e cooperativa
Vários analistas e futurólogos têm defendido que o pós-covid-19 não será jamais uma réplica do pré-covid-19 e que a nova normalidade será diferente da normalidade antecedente. Acredito que sim, particularmente, na forma de fazer política, exigindo mais diálogo, compromissos firmes e maior partilha de responsabilidades. Ouso pensar numa ideia incomum que é uma nova democracia, participativa e cooperativa.
Neste percurso nacional desafiante, há um lado ético e simbólico a não se descuidar: a necessidade de se manter um clima de confiança no seio da sociedade cabo-verdiana. É fundamental que as instituições do Estado preservem a sua credibilidade e confiança junto da sociedade e dos cidadãos. E,igualmente, que gozem e continuem a gozar do respeito e da confiança dos nossos parceiros africanos e internacionais.
Do meu ponto de vista, a nossa reputação política tem sido de índole referencial (a exemplaridade), o que significa que é de natureza ética, portanto, variável.
Aos servidores públicos, em todos os sectores da Administração e em todas as Instituições do Estado, cabe a imensa tarefa de manter e reforçar esta exemplaridade e velar pelo prestígio, pela credibilidade, pela eficiência e pelo respeito ao nosso Estado de Direito Democrático.
Na mesma linha de pensamento, cabe aos atores políticos a árdua tarefa ética de elevar e prestigiar a política e a função política.
Por fim, Cabo Verde e os cabo-verdianos não devem assumir-se, apenas, como um “mais um” à espera; devem ter iniciativa própria e ambicionar, com trabalho árduo, ser diferentes, sempre para melhor!
(Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 707, de 18 de Março de 2021)