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Opinião

“A importância da agricultura familiar para o desenvolvimento sustentável”

José Graziano da Silva, Director-Geral da FAO

A 12ª Conferência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa é uma excelente oportunidade para os países lusófonos reafirmarem seu comprometimento com a implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e a consecução dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Os ODS são interligados entre si. Não será possível, por exemplo, erradicar a fome no mundo (ODS 2) sem que ao mesmo tempo os países eliminem a pobreza extrema (ODS 1) e promovam medidas de adaptação à mudança do clima (ODS 13). É necessário, portanto, a adoção de um “approach” interconectado em busca do desenvolvimento sustentável.

Os setores agrícolas (colheitas, pesca, silvicultura e pecuária) têm papel fundamental a esse respeito. É através da agricultura que o homem e a natureza se conectam. Ademais, grande parte das mais de 800 milhões de pessoas que sofrem de fome no mundo vivem no meio rural e dependem dos setores agrícolas para obter seus meios de vida. Eles são pequenos produtores, pastores, pescadores, aquicultores e silvicultores que se agrupam no que é conhecido como agricultura familiar.

Paradoxalmente, apesar de os agricultores familiares serem um dos grupos sociais mais vulneráveis à fome, à pobreza e aos impactos da mudança do clima, a agricultura familiar produz a maior parte dos alimentos consumidos no mundo. E mais importante: alimentos saudáveis, seguros e nutritivos, os quais são fundamentais no combate aos níveis de obesidade e malnutrição crescentes em todos os países do mundo em razão, sobretudo, do alto consumo de alimentos processados ricos em sal, açúcar e gorduras.

Hoje em dia, o mundo ainda produz a maior parte dos alimentos com base nos princípios da Revolução Verde das décadas de 60 e 70 do século passado, a partir do uso intensivo de químicos e recursos naturais, o que gera alto custo para o meio ambiente.

A Revolução Verde foi muito importante em seu tempo para aumentar de forma rápida e significativa a produção de alimentos. A falta de alimentos era o problema da época. Não é mais. Hoje o mundo já produz mais do que o suficiente para alimentar a todos (o problema agora é o acesso aos alimentos). Chegamos, portanto, a um ponto de inflexão. Necessitamos de sistemas alimentares sustentáveis que ofereçam alimentos acessíveis, saudáveis e nutritivos e que preservem os recursos naturais e a biodiversidade.

A agricultura familiar tem papel fundamental nesse sentido. Desde 2012, na Cimeira de Maputo, que a CPLP possui uma Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional cujo um dos eixos principais é o apoio à agricultura familiar. Na ocasião, a FAO foi escolhida para assistir aos países da CPLP na implementação dessa estratégia. A visão da FAO é que os países lusófonos não podem perder de vista este compromisso em apoiar os mais vulneráveis por meio de políticas específicas de proteção social e de adaptação às mudanças do clima.

Felizmente, temos presenciado importantes avanços nesse sentido. Portugal, por exemplo, adotou no mês passado o Estatuto da Pequena Agricultura Familiar, que deverá beneficiar 100 mil pessoas (40% dos agricultores portugueses). Já o Governo de São Tomé e Príncipe, ao lado de parceiros importantes da sociedade civil, emprega esforços para o estabelecimento de um centro de agricultura sustentável.

Cabo Verde, por sua vez, aprovou nas últimas semanas a Lei do Direito à Alimentação Adequada, que reconhece o direito humano à alimentação adequada para todos os cidadãos, com enfoque na produção local de alimentos saudáveis e nutrientes. Tal esforço conta com o apoio da FAO com vista a diminuir a dependência do país de recursos e alimentos importados. Nesse sentido, a FAO financiou no último biénio 35 projetos com vista a tornar os sistemas alimentares mais produtivos e menos vulneráveis aos impactos da mudança do clima.

Investir na agricultura familiar, portanto, é investir num futuro sustentável, sem que ninguém fique para trás.

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