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Economia

Desemprego, o calcanhar de Aquiles: Reforma económica precisa-se, ou não?

Várias vozes, algumas até pró-Governo, têm questionado a política económica de Cabo Verde, considerando-a “desfasada” das reais necessidades do país, com prevalência do desemprego e “falta de competitividade”. A questão que se coloca é se o modelo económico do país está esgotado ou não. José Maria Neves responde que não.

Cabo Verde ascendeu a País de Desenvolvimento Médio (PDM) a 1 de Janeiro de 2008, mas, como é natural, essa graduação não trouxe, por si só, mais emprego nem fez crescer mais a economia cabo-verdiana. Ainda assim, se antes a economia vivia da ajuda externa, agora, Cabo Verde vê-se confrontado com a redução drástica do apoio internacional, tendo de procurar soluções e alternativas dentro do próprio país (impostos e outros) e na atracção de investimento externo.

Este contexto trouxe consigo importantes desafios, desde logo o do crescimento da economia, que, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), tem conhecido um certo “desaceleramento”. A isso regista-se o facto de o défice público ter atingido os 8,33 % do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014 e a dívida externa ascender já a 112,20% do PIB também nesse ano. A isto acrescem as críticas à falta de competitividade do sector privado, por alegada “falta de um ambiente de negócios favorável”, com “taxas de juros elevadas”, “crédito limitado”, entre outras críticas sobejamente conhecidas.

Não menos gritante tem sido, na opinião de vários analistas, a “preocupante” redução da carga tributária, que se tem reflectido, de forma negativa, nos cofres do país. Com a crise internacional a dar sinais de algum recuo, nota-se, mesmo assim, um agravamento da situação fiscal do Estado e, embora o rendimento per capita tenha aumentado para cerca de 355 escudos em 2014, o certo é que o poder de compra das famílias está longe de ser o desejável.

A isto tudo acresce as elevadas taxas de desemprego (15,8% em 2014, contra os 16,4%, em 2013) para muitos, o maior indicador de que a economia do país não vai bem e, para alguns analistas, um sinal claro de que o modelo de desenvolvimento económico está esgotado.

Tese refutada

José Maria Neves, primeiro-ministro, não concorda com tal apreciação. A seu ver, o modelo económico de Cabo Verde assenta numa agenda de transformação na qual foram “lançadas as bases” para “acelerarmos o ritmo de crescimento económico e de transformação” do país, independentemente das críticas.

“Fizemos um esforço enorme para  modernizar as infraestruturas. Não há crescimento económico, não há construção de uma economia de serviços sem infraestruturas modernas. Investimos fortemente na capacitação dos recursos humanos. Estamos a criar as condições para a densificação do sector privado. Quase todas as 100 medidas  estão a ser compridas e estamos a melhorar o ambiente de negócios, a subir nos índices de competitividade…”, argumenta JMN.

Alicerces esses lançados num momento “desafiante”, ou seja, durante a “transição de Cabo Verde a PDM” e num ambiente que o mesmo descreve de “profunda crise internacional, das mais graves dos últimos 75 anos”.

Em suma, se lá fora a crise internacional não deixou de afectar os chamados países em desenvolvimento, Cabo Verde não ficou de fora, com reflexos a nível do desemprego, já que a economia está longe de se encontrar no seu melhor momento.

“A questão do emprego é estrutural e, desde sempre, tivemos altas taxas de desemprego, atingindo particularmente os jovens e as mulheres sem qualificação”, responde JMN. “Durante muito tempo fez-se a gestão do emprego através da  criação das FAIMO (frentes de alta intensidade de mão de obra) e, anualmente, nos períodos mais críticos, por causa da seca, o Governo  criou trabalhos públicos no meio rural para garantir o emprego de jovens, mulheres e pessoas não qualificadas em todas as ilhas”.

Contudo, a “estratégia das FAIMO”, muito criticada por uns, mas defendida pela população, sobretudo rural, não é uma boa política, mormente quando aumentou substancialmente o número de jovens qualificados, o chamado desemprego jovem que entre os 5 e 24 anos atingiu os 35,8 %, em 2014. “Com o desenvolvimento do país, o desemprego continua ainda a níveis elevados, mas atingindo particularmente jovens qualificados, porque, entretanto, expandimos a qualificação, democratizámos o acesso ao ensino básico secundário e superior e, cada vez mais, temos jovens qualificados à procura de emprego”, admite.

Como reduzir desemprego?

Apesar de tudo, na óptica de JMN, o facto de o desemprego ter-se mantido “mais ou menos a níveis de 16%”, mostra que tem havido “capacidade de resiliência” por parte de Cabo Verde… “Até porque tem havido aumento da população economicamente activa”. Contudo, admite também, “ainda não há um ritmo de crescimento suficiente” para garantir uma redução da taxa de desemprego. Aliás, este é o maior desafio de Cabo Verde” e parece não haver soluções mágicas.

Para o chefe do Governo, a resolução dessa questão não é nova e passa pela transformação económica do país, em curso, “num centro internacional de prestação de serviços, tendo o turismo como o motor desse crescimento e dessa transformação”. Um processo que “não é fácil”, sobretudo, sendo o arquipélago “um país de rendimento médio baixo”, um “pequeno Estado insular, de dez ilhas dispersas”, onde os “elevados custos de transportes, energia e infraestruturação”, aliados  à “escassez de recursos naturais, à seca e desertificação” têm sido factores  restritivos ao processo de crescimento da economia.

Mas, então, que fazer? JMN responde: “Temos de continuar a trabalhar para transformar as vantagens comparativas em fontes de vantagens competitivas do país e mobilizar investimentos privados, directo-estrangeiro, para densificar o sector privado nacional, sobretudo as PME’s, o sector gerador de emprego e continuar a implementar a estratégia de garantir  o crescimento continuado do turismo e todas as actividades conexas, como o agro-negócio, as economias criativas, as tecnologias informacionais, energias renováveis e serviços financeiros e desenvolver o cluster do mar. É essa a estratégia”.

Clusters

No entanto, JMN é consentâneo ao reconhecer que é preciso fazer “um esforço para internacionalizar as empresas e aumentar a produtividade e exportação”, porque, desde logo, um dos maiores problemas de Cabo Verde tem a ver com “a dimensão” do seu mercado, “que é muito pequeno”. Por isso, é preciso “trabalhar para expandir o nosso mercado, com o aumento das exportações, aproveitando o crescimento do mercado turístico e aproveitando pequenos nichos de mercado lá fora”.

Isso, na sua opinião, tem passado pelos clusters em estruturação, um deles o do agronegócio. “As diferentes peças estão a encaixar-se. Mobilizámos mais água, desenvolvemos a agricultura, a pecuária e estamos na fase de transformação dos produtos. Basta ver a última feira do agronegócio”.

O que viabilizou o cluster do agronegócio, um dos mais reconhecidos, não obstante as críticas ao escoamento de produtos devido aos constrangimentos marítimos, foi a expansão do mercado. “Para além do mercado nacional, temos o mercado turístico. Agora, a produção  e a indústria agroalimentar começam a viabilizar-se por causa do crescimento desses mercados”, defende JMN, contrariando as críticas feitas à falta de andamento dos clusters.

A isso acresce o cluster do mar e o desenvolvimento do sector das pescas, o aumento da captura, e da transformação do pescado, assim como a expansão das unidades fabris existentes, a construção das estruturas de frio do Mindelo e o aumento das exportações. “Só a estratégia no domínio das pescas prevê, nos próximos três a quatro anos, a criação de cerca de 20 mil postos de trabalho”, anuncia.

Não menos importante tem sido o “aumento do turismo de cruzeiros”, estando, agora, o Governo em fase de privatização das operações portuárias. “Todo o trabalho legal e institucional está a ser feito nesse sentido e estamos em busca de parcerias para o desenvolvimento de todo o segmento da reparação naval”, havendo, no seu entender, “elementos palpáveis” do desenvolvimento desse cluster.

JMN rebate os críticos que defendem que o investimento em clusters não se tem traduzido em aumento efectivo de postos de trabalho e geração de riqueza. “Não podemos fazer uma transição económica de um dia para o outro, leva algum tempo. O mais importante é ver que as peças estão a encaixar-se  e que os caminhos para a acelaração do ritmo do crescimento económico estão abrir-se.  São esses os aspectos que devemos valorizar neste momento”, conclui.

GC

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